Polêmico e controverso, Fábrica de Vespas conseguiu me deixar indeciso sobre se o odeio ou se o amo. Vou tentar falar um pouco sobre essa obra que me causou tamanha repulsa que cheguei a abandoná-lo algumas vezes. Não pela sua narrativa, mas sim pelo seu conteúdo.
A Trama de Fábrica de Vespas
Antes de qualquer coisa, cabe uma explicação sobre o gênero utilizado em Fábrica de Vespas, Horror com forte uso de Repulsa, que é diferente de terror. Utilizando a Wikipédia em inglês, achei uma explicação mais simples, devidamente traduzida abaixo:
“Terror é geralmente descrito como o sentimento de medo e expectativa que antecede a experiência horrível. Por outro lado, horror é o sentimento de repulsa que geralmente ocorre depois que algo assustador é lido, visto, ouvido ou experimentado. É a sensação que se tem depois de chegar a uma realização terrível ou experimentar uma ocorrência profundamente desagradável. Em outras palavras, horror está mais relacionado a ficar chocado ou assustado (horrorizado), enquanto o terror está mais relacionada à ansiedade ou medo. Horror também pode ser definido como uma combinação de terror e repulsa.”
[dropcap size=small]O[/dropcap] livro Fábrica de Vespas é narrado por Frank Cauldham, então tudo que acompanhamos são seus pensamentos, seus relatos sob sua ótica e aquilo que ele realmente quer contar. Frank é um adolescente de 16 anos que vive praticamente isolado numa ilha, onde fica sua casa, as dunas e uma espécie de refúgio usado por ele para se esconder e manter escondidos seus itens.
Frank vive somente com seu pai, uma figura misteriosa, que quase não fala com o filho nem demonstra carinho nenhum, e que mantém seu escritório sempre trancado, nunca deixando Frank entrar, fazendo com que Frank acredite que algo está guardado em segredo naquele local. Além do pai, Frank possui um irmão com fortes problemas psiquiátricos, Eric, que pende para a psicopatia. O mesmo acontece com Frank, que ainda não revelou seu jeito de ser para ninguém.
“Uma morte é sempre excitante, sempre faz com que você perceba quão vivo e vulnerável está, mas quão sortudo é.”
O livro começa com Frank contando que seu irmão havia acabado de fugir de um hospital psiquiátrico, onde estava internado para tratamento após ser considerado oficialmente louco depois de um episódio traumático. Após esse episódio, Eric ficou conhecido por queimar cães e aterrorizar crianças com minhocas.
Eric então foi condenado à essa internação. A tensão principal do livro, o responsável pelo suspense, é exatamente a aproximação de Eric. Ficamos sabendo dos avanços de Eric através de ligações que ele faz a Frank, sempre sem sentido, mas sempre revelando que estava chegando em casa, com algum objetivo obscuro e maligno. Frank teme a chegada de Eric, pois sabe que algo ruim acontecerá.
“Pelo menos os coelhos não vão saber que Frank Cauldhame fez o que fez a eles, do jeito que um grupo de pessoas sabe sobre o que os bandidos fizeram, com a vingança resultando no efeito contrário ao desejado, estimulando mais do que pondo um fim à resistência. Pelo menos eu admito que fiz tudo para reforçar meu ego, recuperar meu orgulho e me dar prazer, não para salvar a nação, garantir justiça ou honrar os mortos.”
Enquanto seu irmão não chega, Frank vai nos relatando um pouco da sua vida. Frank nos conta que cresceu isolado a mando do pai, que nunca o registrou, fazendo com que ele não possa frequentar a escola, mas receba aulas periódicas do pai em casa. Também não tem o costume de sair muito de casa, coisa raríssima no livro, então compensa sua solidão da maneira que mais lhe agrada: torturando animais.
Não em todo o momento, mas é comum Frank nos relatar a captura de animais para suas torres de vigia, estacas com cabeças de animais mortos que, na sua mente, protegem a propriedade contra intrusos. Também temos a própria fábrica de vespas, onde através de um ritual envolvendo as ditas criaturas, Frank acredita conseguir ver o futuro, tentando ver como será a chegada de Eric, mas sem sucesso.
Ainda possui o crânio de um cão como forma de tentar contatar a mente de pessoas. Frank ainda esconde um grande mistério sobre uma deficiência, algo que só é revelado mais pra frente no livro.
Frank também nos relata seus três assassinatos, que começaram aos 6 anos de idade, vitimando crianças da família. Frank diz não querer mais matar ninguém, mas que essas três foram necessárias.
Comentário e Crítica
Fábrica de Vespas é um livro que dividiu minha opinião como nenhum outro conseguiu. Por um lado temos uma escrita impecável, com Iain Banks conduzindo sua trama de maneira perfeita, criando uma atmosfera de tensão muito forte conforme Eric vai chegando. Ao mesmo tempo, Banks nos dá cenas de horror e repulsa, quando relata as torturas e mortes que Frank faz ao longo do livro e relata as que já fez, assim como quando Frank nos conta sobre Eric.
Pela narrativa, que culmina num final impressionante, de tirar o fôlego e completamente inesperado, Banks mostra que conseguiu atingir um nível de perfeição logo em seu primeiro livro.
“Tô indo bem. Comendo cães! Há, há, há.”
Suspirei. “Meu Deus, isso não é verdade, é?”
“O que mais eu posso comer? É ótimo, Frank, meu velho. Estou ficando nos campos e nos bosques, andando bastante e pegando caronas, e quando chego perto de alguma cidade, eu procuro por um cachorro bem gordão e suculento, e faço amizade com ele, e levo-o para o meio do bosque, e daí mato e como ele. Dava para ser mais simples? Adoro a vida ao ar livre.”
Porém, para um amante de animais, esse livro se torna forte. Todas as vezes que lia a tortura e a morte de animais, tentei colocar na cabeça que tudo se tratava apenas de ficção. Mas a narrativa de Banks é tão forte, tão crua e tão magistral, que me fez imaginar aquilo vividamente na minha cabeça, me deixando, eu confesso, meio mau.
Não consegui relaxar em nenhum momento com esse livro em mãos, inclusive tendo que ler ele em outro horário, pois costumo ler à noite e esse livro não me deixava ter o relaxamento necessário para poder dormir tranquilamente. O que senti na leitura, do início ao fim, foi tensão.
Esse sentimento está sempre presente na leitura de um livro desses. Com o horror aparecendo regularmente, e a repulsa sendo sentida em vários capítulos, não qualifico como uma leitura agradável, daquelas que você busca para relaxar e descontrair, mas que consegue ser fascinante se lido no momento certo, por aqueles que sabem o que vão encontrar e que se interessam pela mente de psicopatas.
Consideração Final
Banks conseguiu mostrar, de maneira crua e sem receios, a cabeça e os pensamentos de um psicopata. Esse livro evoca os grandes clássicos do gênero, desde Senhor das Moscas, com uma leve dose de Laranja Mecânica e passando por Precisamos Falar Sobre o Kevin. Banks consegue se destacar na literatura sendo genial na sua escrita, mas fazendo com que seu livro seja indicado para poucos.
Sua leitura é mais do que recomendada se você está procurando entender como funciona a mente de psicopatas, e Banks oferece isso em tempo real. Também recomendo a leitura para quem quer muito suspense e tem estômago forte, mas também para quem quer se arriscar. A minha consideração sobre esse livro: genial, cruel, fascinante, aterrorizante, magistral.
“Esse é o placar até agora. Três. Não mato ninguém há anos, e não pretendo fazer isso de novo. Foi só uma fase pela qual passei.”
Produto
A Darkside Books consegue se superar sempre. Desde o anuncio da publicação desse livro, no começo do ano, ele despertou meu interesse, e a Darkside realmente nos mostra porque esse livro só poderia ser publicado pela editora do Horror. Através da incrível generosidade deles, me foi cedido um exemplar para avaliação, e como não poderia deixar de ser, a qualidade do livro é digna de nota.
Com sua sempre presente capa dura, esse livro mostra que será enigmático já pela capa, uma vez que ela não revela absolutamente nada, trazendo somente a dúvida sobre o que será essa figura estranha com uma sombra mais estranha ainda. Com uma vespa em baixo relevo na capa e impressão de qualidade, se torna um livro muito fascinante, desde o físico até seu conteúdo. Meus parabéns a editora e aos responsáveis.
[divider]Sinopse[/divider]
Frank – um garoto de 16 anos bastante incomum – vive com seu pai em um vilarejo afastado, em uma ilha escocesa. A vida deles, para dizer o mínimo, não é nada convencional. A mãe de Frank os abandonou anos atrás; Eric, seu irmão mais velho, está confinado em um hospital psiquiátrico; e seu pai é um excêntrico sem tamanho.
Para aliviar suas angústias e frustrações, Frank começa a praticar estranhos atos de violência, criando bizarros rituais diários onde encontra algum alívio e consolo. Suas únicas tentativas de contato com o mundo exterior são Jamie, seu amigo anão, com quem bebe no pub local, e os animais que persegue ao redor da ilha.
Abandonado à própria sorte para observar a natureza e inventar sua própria teologia – a maneira do Robinson Crusoé de Daniel Defoe –, Frank desconhece a escola e o serviço social, já que seu pai acredita na educação “natural”, recomendada pelo filósofo do século XVIII Jean-Jacques Rousseau e apresentada em seu romance Emílio, ou Da Educação (1762), que sugere que as crianças devem crescer entre as belezas da natureza, permitindo que elas se deleitem com a flora e a fauna.
A natureza humana seria boa a princípio, mas corrompida pela civilização. Quando descobre que Eric fugiu do hospital, Frank tem que preparar o terreno para o inevitável retorno de seu irmão – um acontecimento que implode os mistérios do passado e vai mudar a vida de Frank por completo.
[divider]Sobre o Autor[/divider]
Iain Banks (1954-2013) nasceu e viveu na Escócia. Tornou-se amplamente conhecido pela controvérsia causada pelo seu primeiro romance, Fábrica de Vespas, publicado originalmente em 1984. Desde então, foi aclamado tanto pela crítica como pelos seus leitores por dezenas de obras de ficção e ficção científica.
Foi considerado um dos Melhores Novos Escritores Britânicos em 1993. O jornal inglês The Times aclamou Iain Banks como “o romancista britânico mais imaginativo de sua geração” e o Guardian considerou-o “o padrão pelo qual o restante da ficção científica é julgado”.
Links
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Especificações Técnicas
- Título | Fábrica de Vespas
- Autor | Iain Banks
- Tradutor | Leandro Durazzo
- Editora | DarkSide®
- Edição | 1a
- Idioma | Português
- Especificações | 240 páginas, Limited Edition (capa dura)
- Dimensões | 14 x 21 cm
Sobre o Autor
Um leitor assíduo da fantasia e do terror, vem descobrindo aos poucos as maravilhas da Ficção Científica e dos Romances Históricos. Crítico e perfeccionista, procura falhas até nos livros mais perfeitos. Nas horas vagas escuta Heavy Metal e lê ainda mais.