“Baseado em fatos reais”, quando a competência é o diferencial.
O Texto a seguir contém possíveis spoilers a respeito da trama e fatos do filme
O ano é 1952, o casal Warren funda o New England Society for Psychic Researchgations (N.E.S.P.R.) e abrem um museu do ocultismo em Monroe – Connecticut. Durante cinco décadas de estudos, segundo seus dados, os Warren ostentam a impressionante marca de 10.000 casos investigados que, consequentemente, renderam vários livros sobre demonologia, e alguns adaptações para cinema, é claro.
Invocação do Mal (The Conjuring) é baseado em um destes casos investigados por Ed e Lorraine Warren, o da fazenda Harrisville, Rhode Island. Em 1971, começamos a acompanhar a história dos Perron, uma família de classe média americana composta por pai, mãe e suas cinco filhas que vão morar na nova residência, recém-adquirida em um leilão onde todas as suas economias foram investidas. Obviamente os responsáveis pela venda nunca informam o histórico da casa, e esta, para variar, é no meio do nada, e completando o cenário os Perron não eram uma família religiosa…
Bem, com estes referenciais já dá para perceber que boas coisas não estão reservadas à família Perron. Só que neste ponto começamos a ver que mesmo em um terreno tão desgastado, a competência de James Wan (Jogos Mortais, Sentença de Morte, Sobrenatural) e sua equipe começam a fazer a diferença, o diretor nos convida a conhecer a casa nova dos Perron de forma intimista e detalhada, como se fossemos um dos novos moradores, câmeras e ângulos bem executados que tanto servem para criar tensão ou simplesmente contextualizar e nos posicionar claramente no transcorrer das cenas e no desenrolar da trama, lembrando muito estas séries de TV que cuidam de casos paranormais (Inclusive Lorraine Warren pode ser vista em ação na série “Paranormal State”, exibido no Biography Channel).
A película é conduzida com leveza e inteligência usando os clichês habituais ao gênero de forma eficaz e criando um clima de tensão que vai desestruturando os nervos do espectador. Chegamos ao segundo ponto que faz Invocação do Mal “respirar” muito bem em relação a obras similares do gênero, o elenco, o sempre competente Patrick Wilson (The Phantom of the Opera, Watchmen, Esquadrão Classe A) vive Ed Warren e a também tarimbada Vera Farmiga (Amor sem Escalas, Os Infiltrados, Bates Motel) vive Lorraine Warren, ambos estão ótimos em seus papeis. Os atores conseguem passar credibilidade em um cenário que geralmente tende a descambar para o ridículo ou caricato, a mais exigida, porém é Lily Taylor (Short Cuts – Cenas da Vida, Alta Fidelidade, Inimigos Públicos) que vive Carolyn Perron, a mãe que tenta desesperadamente proteger sua família das forças das trevas.
Chegamos ao terceiro ponto que da mais credibilidade ao filme, a excelente cenografia, o espectador mergulha nos anos 70, que sem duvida foi uma das décadas mais fecundas para obras de terror que virariam clássicos eternos. O cuidado que o roteiro tem em fornecer de forma didática vários elementos históricos sobre o mundo sobrenatural só aumenta a sensação de imersão na trama. A casa da fazenda Harrisville já entra para história do cinema como um dos locais que, com toda certeza, você não gostaria de passar uma noite…
Invocação do Mal nos conduz magistralmente por esta jornada onde bem e mal se confrontam e lutam pelas almas da família Perron, contudo não há nada de inovador, nada que vá elevar o gênero às alturas, o final é previsível assim como a luz do sol presente em quase todos os finais destes filmes indica que tudo “acabou bem”, porém desta vez há algo no ar, talvez pelas pistas deixadas e da forma que o filme nos apresentou o casal Warren ficamos com a sensação que aquilo é só o começo de sua jornada nas telas.
Fica aquele gostinho de “quero mais” e ainda por cima, quando conhecemos mais um pouco da mitologia dos Warren, você pensa que isto tudo pode se tornar uma franquia de filmes onde poderemos acompanhar o casal em sua cruzada contra as trevas, já que o lendário caso de Amityville também foi investigado por eles. Talvez tenha me envolvido mais com este filme que o habitual, pois sempre curti este tipo de universo e fica a sensação que o casal Warren poderia ter perfeitamente entre seu círculo de conhecidos John Constantine e os irmãos Winchester…
O que acaba tirando um pouco o encanto deste tipo de produção é que vivemos em uma sociedade tão cínica e dessensibilizada, que o terror perdeu a força nas telas do cinema, basta você assistir a um telejornal e vemos uma enxurrada de notícias assustadoras, garoto de 13 anos supostamente chacina toda a família e se mata sem nenhuma explicação lógica, um atirador ceifa a vida de 12 pessoas em uma base naval sem aparente motivação ou ainda no dia 21 de setembro, ironicamente dia mundial da paz, ao menos 30 pessoas morreram e mais de 60 ficaram feridas por atiradores que invadiram o shopping Westgate, na capital do Quênia.
Ao que tudo indica, entre o Céu e o Inferno, o plano terreno acabou se especializando em nos chocar e horrorizar com maestria, deixando as criaturas do além meio que ultrapassadas, contudo se você é uma daquelas pessoas que como eu, ainda curte o cinema de terror, e adora algumas horas de escapismo barato e de sentir medo, vá ao cinema e confira Invocação do Mal, caso não consiga, assista quando sair em DVD e potencialize a experiência assistindo de madrugada, tenho certeza que depois de assistir ao filme, se tiver sede e desejar aquele copo com água, aí meu amigo, o caminho da cozinha, em sua residência toda as escuras, nunca lhe parecerá tão longo…
Gênero: Terror
Direção: James Wan
Roteiro: Carey Hayes, Chad Hayes
Elenco: Amy Tipton, Arnell Powell, Ashley White, Cabrenna H. Burks, Christopher Cozort, Christy Johnson, Courtney Lakin, Darrell Rackley, Desi Domo, Grace Layden, Hayley McFarland, Jamie Broadnax, Joe Montanti, Joey King, John Brotherton, Justin A. Thuesen, Karen Malina, Kyla Deaver, Lili Taylor, Mackenzie Foy, Marion Guyot, Matthew Pabo, Melllie Boozer, Meredith Jackson, Millie Wannamaker, Morganna Bridgers, Nate Seman, Patrick Wilson, Paul Shaplin, Ron Livingston, Rose Bachtel, Sarah Maykish, Shanley Caswell, Shannon Kook, Shawn Collins, Sterling Jerins, Steve Coulter, Tiyana Blue, Tony Moore, Vera Farmiga, Zach Pappas, Zachary Steffey
Produção: Peter Safran, Rob Cowan, Tony DeRosa-Grund
Fotografia: John R. Leonetti
Montador: Kirk M. Morri
Trilha Sonora: Joseph Bishara
Duração: 112 min.
Ano: 2013
País: Estados Unidos
Distribuidora: Warner Bros
Estúdio: Evergreen Media Group / New Line Cinema / The Safran Company
Classificação: 14 anos
Pontuação: 3,5
Sobre o Autor
É Bacharel em Psicologia, porém optou por sua grande paixão trabalhando como ilustrador e quadrinhista. É sócio do Pencil Blue Studio e Ponto Zero, podendo assim viver e falar do que gosta: quadrinhos, cinema, séries de TV e literatura.